No tempo em que os ministros rezavam o terço

Pe. Juan Carlos Casté, EP
Nada há de mais interessante do que a História. Ela registra fatos e situações que nem o mais hábil romancista seria capaz de imaginar. Consideremos, por exemplo, o pequeno episódio acontecido no interior de uma carruagem francesa, em meados do século XIX, quando os ventos anti-clericais ainda sopravam com força:
França, 1826. Uma espaçosa diligência se desloca em direção a Lyon. Dentro dela, seis passageiros anseiam pelo momento da chegada ao destino.
Um deles, já avançado na idade, com uma desgrenhada barba branca, decide ocupar-se em agredir verbalmente um jovem sacerdote que, sentado em um canto, reza seu breviário. Diante do silêncio do eclesiástico, o anticlerical se exalta e começa a soltar cada vez mais a língua: “Eu trabalho na Administração Nacional, e tenho direito a dizer o que penso. Aposto que esse corvo não agüentará mais e se verá obrigado a descer na próxima parada”, falava, rindo às gargalhadas.
Ao lado do sacerdote viajam dois senhores bem apessoados que também atraem os dardos do velho anticlerical: “Devem ser dois jesuítas; aposto 100 francos que os faço saltar também”.
Nesse momento, a diligência passa por uma dessas típicas aldeias do interior da França, exatamente quando o dobrar dos sinos convida à oração do Angelus. Os dois senhores se persignam, e rezam a saudação a Nossa Senhora, provocando no velho ateu uma explosão de risos e sarcasmos contra os “corvos”. Porém eles permanecem impassíveis. Dissimuladamente trocam entre si um sorriso cúmplice com certa nota de picardia.
— Meu caro Conde, é hora de rezar meu terço. Quer me acompanhar?
— Claro, caro Visconde.
— Eu os acompanho, se me permitirem — interveio o jovem sacerdote.
O ambiente muda. O anticlerical sente-se mal, desagradado. O riso se lhe congela nos lábios. Quando terminam de rezar, a diligência chega à parada seguinte. O sacerdote, ao descer, pergunta aos desconhecidos:
— Posso saber vossos nomes, senhores?
— Claro. Visconde Mathieu de Montmorency, ministro de Relações Exteriores, para servi-lo.
— Conde Veillèle, Presidente do Conselho de Ministros e Ministro das Finanças, às suas ordens.
Todos os passageiros ficam boquiabertos. O “funcionário da Administração Nacional” não sabe onde esconder a cabeça. O Conde de Veillèle volta-se para ele e diz-lhe: “Acho que o senhor perdeu a aposta; deve pagar 100 francos”.

O irreverente ateu vê-se obrigado a desembolsar a quantia. O presidente do Conselho de Ministros voltou-se para o não menos surpreso sacerdote, entrega- lhe o dinheiro e lhe diz: “Para as obras de caridade de sua paróquia, senhor padre”. 
Revista Arautos do Evangelho n.6. jun 2002

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