No longínquo ano de 1263, caminhava para Roma um sacerdote de
nome Pedro, originário de Praga, segundo a tradição. Encontrando- se muito
tentado em sua crença na presença real de Cristo na hóstia consagrada, fazia
uma peregrinação para revigorar sua fé vacilante, pois sua identidade
sacerdotal estava em jogo naquele atormentado período de sua vida. Ao se
aproximar de Bolsena, decidiu entrar na cidade para prostrar-se diante do
túmulo de Santa Cristina — mártir dos primeiros séculos do Cristianismo,da qual
era muito devoto e ali celebrar a Eucaristia. Durante a Missa, voltou-lhe à
mente a dúvida atroz que o atormentava, e ele pediu com insistência a
intercessão da Santa a fim de conseguir aquela mesma fortaleza na Fé que a fez
enfrentar o martírio. No momento da Consagração, tendo a hóstia em suas mãos,
pronunciou as palavras rituais: “Isto é meu Corpo...”. Imediatamente ocorreu o
milagre: a hóstia tomou uma tonalidade avermelhada e começou a gotejar sangue,
o qual caiu copiosamente sobre o corporal.
Os fiéis presentes também puderam contemplar o acontecimento e,
estupefatos, comentavam-no com a vivacidade característica da região. Como
prosseguir a celebração depois dessa impressionante manifestação divina? Faltou
ânimo ao sacerdote. Tomado de imensa alegria e, ao mesmo tempo, de grande
comoção, interrompeu a Missa, envolveu no corporal as espécies eucarísticas e
dirigiu-se à sacristia. Sua torturante dúvida estava desfeita, sentia a alma cheia
da Fé na presença real de Cristo na Eucaristia, e o coração transbordante de gratidão
a Deus e à sua santa intercessora. Passados os momentos iniciais de forte
emoção, decidiu ele ir sem demora comunicar o milagre ao Papa Urbano IV, que
então residia temporariamente na vizinha cidade de Orvieto. Desejava também
confessar ao Vigário de Cristo seu pecado de dúvida e pedir-lhe a absolvição.
Averiguações
e confirmação do milagre
Com toda paternalidade, o Pontífice atendeu-o, juntamente com os
clérigos e demais testemunhas do prodígio. Depois de ouvir com atenção todos os
detalhes do acontecimento, resolveu enviar a Bolsena uma comissão chefiada pelo
próprio Arcebispo de Orvieto — consta que dela faziam parte São Tomás de Aquino
e São Boaventura — incumbida de fazer uma rigorosa averiguação dos fatos e, se
confirmado o milagre, trazer as preciosas relíquias até ele. Após cuidadosas
verificações, a comissão concluiu que tinha havido realmente um milagre.
Formou-se então uma esplendorosa procissão para conduzir as inapreciáveis relíquias.
Dela participavam os dignitários e uma multidão de fiéis da cidade de Bolsena,
agitando ramos de oliveira. A seu encontro, veio de Orvieto outra procissão, formada
pelo Papa, sua corte, os membros do clero e numeroso povo. Urbano IV
prostrou-se de joelhos em terra para receber a Sagrada Hóstia envolta no
corporal de linho impregnado do Preciosíssimo Sangue de nosso Redentor. Em
seguida, dirigiram-se todos para a velha catedral. Ali, as Sagradas Espécies e o
corporal foram mostrados ao público exultante de alegria e emoção, antes de
serem colocados no sacrário. Com toda a Igreja, tinha o Papa conhecimento do
famoso milagre de Lanciano, em que a hóstia e o vinho consagrados se
transformaram em carne e sangue visíveis e tangíveis, conservando- se assim,
sem se decompor, desde o século oitavo. Além disto, ele fora confidente de
Santa Juliana de Mont Cornillon, a qual, em visões místicas, recebera dos Céus
a incumbência de transmitir à Igreja o desejo divino de ser incluída no
Calendário Litúrgico uma festa em honra da Eucaristia.
Instituição
da Festa do Corpo de Deus
E, agora, diante do acontecido em
Bolsena, não lhe restava mais nenhuma dúvida sobre o que lhe competia fazer. Assim,
no dia 11 de agosto de 1264, através da bula Transiturus de Hoc Mundo, instituiu
a Festa de Corpus Christi, estendendo para todo o orbe cristão o
culto público à Sagrada Eucaristia, que era oficiado apenas em algumas
dioceses, por influência de Santa Juliana. Cinquenta anos mais tarde, o Papa
Clemente V tornou obrigatória a celebração dessa Festa da Eucaristia. E o Concílio
de Trento, em meados do século XVI, oficializou as procissões eucarísticas, como
ação de graças pelo dom supremo da Eucaristia e como manifestação pública de fé
na presença real de Cristo na Hóstia Sagrada. Estava, assim, instaurada em toda
a Igreja a “Festa em que o Povo de Deus se reúne à volta do tesouro mais
precioso herdado de Cristo, o Sacramento de sua própria Presença, e O louva,
canta e leva em procissão pelas ruas da cidade” (João Paulo II, Homilia durante
a solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo, 14/6/2001).
Para conter as preciosas relíquias do milagre de Bolsena, a piedade
católica fez confeccionar um esplendoroso relicário e, depois, erigir a belíssima
Catedral gótica de Orvieto, cuja fachada colorida até hoje é objeto de
admiração no mundo inteiro.
Preparativos para a Procissão de Corpus Christi no Projeto
Futuro e Vida
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